Ao consultar um roteiro da cidade de Lisboa, foi com grande
surpresa que encontrei uma rua com o nome de um grande amigo meu - facto que de
todo desconhecia. Rua Padre Gregório Verdonk. Fica ali para os lados do Areeiro.
junto à Rua Alves Torgo,
Quem durante os anos quarenta e cinquenta, morando em
Moscavide, não conheceu ou não ouviu falar do Padre Gregório, não o visitou, não
lhe pediu um favor, um emprego, uma benesse uma palavra amiga? Creio que muito
pouca gente.
O Padre Gregório era holandês e chegou a Portugal aí por
volta de 1939, pouco após o início da 2ª guerra mundial. Tinha eu, portanto, 10
anos e ele quantos? Como sempre acontece 0s garotos têm tendência para
considerar” velho” toda e qualquer pessoa adulta e eu não fui uma excepção à
regra. Foi assim que sempre vi o Padre Gregório. Hoje, pensando nisso, tenho de
concluir que ele devia ser ainda bastante jovem, não tendo talvez (se é que
tinha) mais de trinta anos Chegado a Portugal como disse, juntamente com outros
padres da sua Ordem - a Congregação dos Sagrados Corações , ou “Padres Brancos”,
como lhe chamavam por ser essa a cor das suas vestes, instalou-se no Seminário
dos Olivais, onde por essa altura, quase todos os professores eram
estrangeiros.
Mas o Padre Gregório não veio como professor. Ele era
uma espécie de missionário que ia pelas terras sem pároco pregando e espalhando
a fé que professava - o que fazia com grande empenho e óptimos resultados, ao
que julgo. Ao que me consta o seu anterior trabalho de missionário teria sido na
Alemanha com as crianças judias, mas acabara por ser expulso pelo regime nazi.
Era uma pessoa extremamente bondosa e com clara vocação para lidar com rapazes
- motivo porque fundou um grupo de escuteiros ao qual se dedicava com grande
entusiasmo nos intervalos das suas pregações. Aliás, se bem me lembro, as
pregações só começaram mais tarde, depois de aprender a língua portuguesa -
o
que ele fez principalmente com o convívio da rapaziada que nem sempre lhe
ensinava o português mais adequado, com consequentes situações embaraçosas, por
vezes.
Antes de estar tão embrenhado nas suas saídas de pregação o
bom do Padre Gregório estava sempre disponível para a rapaziada: organizava
jogos, excursões, passeios, e franqueava-nos, quase diariamente a belíssima
quinta do Seminário, onde jogávamos à bola, utilizávamos como piscina o seu
maior lago, fazíamos jogos escutistas, pintávamos a manta.
Mas o melhor eram os frequentes acampamentos que nos
proporcionava em quintas maravilhosas de gente rica, com capelas privativas, que
faziam questão em agradar ao bondoso padre, que aos poucos começou a ganhar
fama de santo e - sobretudo a quem é rico e pode - dá sempre muito jeito ter um
santo assim por perto.
O
que mais nos agradava era o grande acampamento de verão que durava todo o mês de
Agosto. O primeiro foi na Roliça e todos os outros em Torres Vedras na Quinta
das Fontaínhas. Era uma aventura. Todo o percurso de ida e volta para tais
locais era feito a pé, puxando uma carrocinha com a tralha toda e víveres, e
acampando pelo caminho, em várias etapas.
Oh, belos e descuidados tempos da minha adolescência! Como era doce o fluir
do tempo!
* * *
Depois o Padre Gregório começou a passar mais tempo fora nas suas pregações,
passou a ter menos tempo para nós até que deixou de residir no Seminário dos
Olivais, passando a morar na Penha de França em instalações que a sua
Congregação criou para albergar os diversos membros existentes em Portugal, até
que, aí por meados da década de cinquenta, de todo nos deixou. Depois disso
vi-o , numa visita de cerimónia que me fez em minha casa, quando saí da prisão
em Abril de 1959 e duas vezes em encontros organizados pelos antigos escuteiros
do seu e nosso Grupo, a última das quais no Natal de 1960.
E nunca mais o vi.
Foi como se para nós (pelo menos para a maioria de nós)
tivesse morrido
Entretanto, a sua fama de santo ia aumentando.
Chegavam-me ecos de “milagres” que teria feito aqui e além. Passou a ser
objecto de adoração das beatas e coqueluche de gente bem. Será que o Padre
Gregório acreditava mesmo nesses milagres e estimulava essa crença? Só sei que
ele já não era a mesma pessoa que eu tinha conhecido e falar com ele era quase
tão difícil como falar com o Papa. Foi sempre muito estranha para mim esta
metamorfose.
O santo homem que eu conheci era bem melhor do que o
“santo” das beatas e ornamento de casas ricas em que se tornou.
Sei que, passou a ser confessor de Salazar, pelo menos nos últimos anos da vida
do ditador, e que terá morrido a meio da década de oitenta, não sei exactamente
quando.
Foto publicada no Diário de Notícias de 18 de
Setembro de 1968,
à saída de uma visita ao enfermo professor Salazar, a quem prestava assistência espiritual
à saída de uma visita ao enfermo professor Salazar, a quem prestava assistência espiritual
Agora, longe da sua pátria, onde obviamente ninguém o deve
conhecer, pois aqui passou e trabalhou a maior parte da sua vida, é nome de
rua o padre holandês que aqui chegou cheio de entusiasmo pela acção - que ele
obviamente considerava missionária - junto dos rapazes e que tão gratificantes
recordações me deixou desses tempos.
O Santo, não me diz nada, mas o Homem, permanece na minha
memória como uma das pessoas mais bondosas e afáveis que me foi dado conhecer.
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Correcção
Contrariamente ao que eu pensava, informa-me um visitante do meu site - também ele grande admirador do padre Gregório - que também na Holanda ele era muito conhecido, tendo sido condecorado pela rainha, pouco antes do seu falecimento
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Mais me informa este visitante que o Padre Gregório nasceu em 10 de Janeiro de 1904 (é curioso, pois ele comemorava o seu aniversário natalício em 10 de Fevereiro) e faleceu em 10 de Janeiro de 1980
Contrariamente ao que eu pensava, informa-me um visitante do meu site - também ele grande admirador do padre Gregório - que também na Holanda ele era muito conhecido, tendo sido condecorado pela rainha, pouco antes do seu falecimento
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Mais me informa este visitante que o Padre Gregório nasceu em 10 de Janeiro de 1904 (é curioso, pois ele comemorava o seu aniversário natalício em 10 de Fevereiro) e faleceu em 10 de Janeiro de 1980
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